| Jornal online - Registo ERC nº 125301



A propósito da dissolução do Parlamento
Publicado quarta-feira, dezembro 01, 2004 | Por: Notícias do Nordeste

Li recentemente um pequeno texto, disponível no site do INE (Instituto Nacional de Estatística), que constituiu a base para a redacção de um artigo de opinião que hoje mesmo seria editado aqui no Noticias do Nordeste. Contudo, os acontecimentos de ontem, acabaram por transformar esse meu artigo num texto sem préstimo, ultrapassado, e sem a actualidade desejada, uma vez que o que se criticava era o Governo de Santana Lopes, e o que se pedia era eleições antecipadas. Ora, essas vêm aí em Fevereiro, já que Jorge Sampaio, numa decisão que peca por tardia, resolveu ontem dissolver a Assembleia da República.
A permanência de Santana Lopes durante quatro meses à frente dos destinos do país teve algumas consequências gravosas, bem documentadas pelo descontentamento generalizado de variados sectores da política, da sociedade e da economia portuguesa. Em apenas quatro meses o governo de Santana Lopes conseguiu destruir o “bebé da incubadora”, se como “bebé” interpretarmos a débil recuperação que a economia portuguesa estava a ter.
Se tivermos como referência esse pequeno texto do INE que inicialmenete aludi, com o titulo “Síntese Económica de Conjuntura”, verificamos que durante os últimos meses Portugal se comportou a nível económico como um verdadeiro caranguejo.
Esse documento, refere-se ao terceiro trimestre de 2004 e é produzido com base na informação disponível até 19 de Novembro. O INE descreve um quadro pouco optimista para a fase conjuntural que a economia portuguesa atravessa.
No terceiro trimestre do ano “o indicador de actividade abrandou”, o mesmo acontecendo com “o indicador de clima económico”, o que demonstra, segundo o INE, “que as expectativas dos agentes económicos sobre a evolução da economia se apresentam menos favoráveis”.
Mas o quadro escuro que é rabiscado nessa síntese, fica ainda mais carregado com os índices apontados para a Taxa de Desemprego. Segundo os dados recolhidos até Outubro de 2004 “o emprego diminuiu ligeiramente, o desemprego aumentou mais intensamente e a taxa de desemprego alcançou o nível mais elevado desde 1998”.
Se continuarmos a leitura do documento verificamos que a situação é ainda muito mais gravosa, uma vez que as quebras que ditaram o abrandamento da actividade económica se localizam na indústria transformadora, ou seja, num dos principais sectores da economia portuguesa. Aqui a quebra chegou a atingir uma cifra negativa de “-2,8% do índice de produção, quando esta medida ainda registara uma variação positiva no trimestre precedente”.
Por aqui se poderá avaliar a confiança que o Governo de Santana Lopes inspirava nos Agentes Económicos. Mas… adiante.
Um outro indicador vulgarmente utilizado para aferir a saúde da economia portuguesa é o sector da construção. Ora, segundo este relatório trimestral “na construção, o andamento negativo voltou a acentuar-se, passando a variação homóloga do índice de produção para -5,1%, quando no segundo trimestre se situara em -2,8%. Este agravamento registou-se tanto na construção de edifícios como nas obras de engenharia”.
E o que se passou nos outros sectores? Vejamos então o que apurou o Instituto Nacional de Estatística:
Nos serviços observou-se um abrandamento significativo do crescimento do volume de negócios, na ordem de 4,0 pontos percentuais, generalizado aos principais sub sectores, mas com destaque para o comércio por grosso e de automóveis, os serviços imobiliários e de prestação de serviços às empresas, e os de alojamento e restauração. A única excepção foi o comércio a retalho, tendo o índice crescido mais intensamente do que anteriormente”.
Mas as más notícias não ficam por aqui. O texto de súmula do INE sobre a actual realidade conjuntural portuguesa continua com a referência a dados que constituem forte matéria de preocupação.
Que concluímos daqui numa primeira abordagem empírica?
O que imediatamente se constata é que este abrandamento, e de certa forma retrocesso da economia portuguesa, se processou exactamente num período de grande instabilidade política criada pela governação de Santana Lopes. Se antes da sua tomada de posse se esboçava uma retoma da confiança por parte dos agentes económicos portugueses, essa retoma parece ter-se esvaído, parece ter-se retraído, conforme atestam os dados recolhidos pelo INE.
Na verdade, Portugal construiu nos últimos quatros meses, uma verdadeira paródia sobre si mesmo. E tudo começou quando um Presidente da Republica eleito pelos votos da esquerda viabilizou um primeiro–ministro não sufragado pelos eleitores portugueses, e com ele todo um Governo que passa para a história como o mais à direita de que há memória desde o 25 de Abril.
Ms o mais dramático é que esse Governo entra logo com o pé “esquerdo”, e o seu responsável máximo troca de imediato os pés pelas mãos no processo de nomeações em cargos de gestão de alta responsabilidade, com efectivamente o são as Secretarias de Estado. Depois veio o escândalo da colocação de professores, seguiu-se o caso Marcelo, e agora a crise criada com a demissão do ministro Henrique Chaves.
Ora, toda esta situação faz-me lembrar aquele conceito de “barracada” à portuguesa, uma vez que sobre tudo isto foi montada uma verdadeira tenda de paródia nacional, onde parecia interessar mais o riso que se gerava com as “patacoadas comportamentais” dos políticos no poder, do que a responsabilidade que deveria ser exigida a esses mesmos políticos.
No meio de toda esta autêntica “anedota nacional” de que todos fizemos um pouco parte, lá surgiu a coragem de uma voz mais sisuda, mas ao mesmo tempo uma das poucas vozes que se poderá considerar como verdadeiramente respeitável. Refiro-me, claro está, a Cavaco Silva, que como político competente, ilustre professor e responsável cidadão, decidiu gritar no último fim-de-semana contra esta autêntica “pouca vergonha” que estava instalada em Portugal.
Sabemos que Cavaco foi um dos primeiros – ministros com maior competência a nível técnico na história do pós 25 de Abril, e por isso mesmo foram consideradas alarmantes as suas declarações. Porque quando Aníbal Cavaco Silva denunciou a incompetência de alguns políticos portugueses, não pretendeu dirigir-se à oposição. Pretendeu sim dirigir-se aos políticos que tinham de pôr à prova as suas verdadeiras capacidades e competências. E essa obrigação para com os portugueses cabia sobretudo àqueles que detinham e ainda detêm os cargos de decisão, ou seja, cabia ao PSD e ao CDS/PP.
Por isso, o destino de Santana Lopes parece ter ficado traçado desde o último fim-de-semana, porque é a sua própria “família” política que se insurge contra o autêntico descalabro que tinha atingido a democracia portuguesa.
Não sei se as declarações de Cavaco Silva ajudaram de alguma forma ao desenrolar dos acontecimentos, mas o certo é que logo de seguida o Senhor Presidente da República resolveu pôr cobro às traquinices do “menino Lopes”. No entanto, todo este tempo que mediou entre a fuga de Durão Barroso e o dia de ontem, 30 de Novembro, criou algumas mazelas económicas, cuja recuperação e cura terão mais uma vez de sair do esforço colectivo dos portugueses. Por isso, se ontem foi dia de acabar com o circo, hoje é hora de recomeçar a semear o pão. E, parafraseando Cavaco Silva, esperemos que com as próximas eleições “ a moeda boa seja capaz de afastar a moeda má”.
Luis Pereira

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