A Regionalização Socrática


Nas Jornadas Parlamentares do PS, realizadas no passado Sábado em Viseu, no seu discurso de encerramento José Sócrates veio anunciar que o Governo quer avançar com a regionalização, defendendo para já a montagem de cinco regiões plano onde se sustentará uma nova prática organizacional dos serviços do Estado.
Sócrates defendeu esta nova estruturação territorial do estado e disse não compreender a surpresa manifestada por muitos, uma vez que, refere Sócrates, “essa orientação está escrita num livrinho: chama-se Programa do Governo do PS. Lá está escrito que devemos aproveitar as cinco regiões-plano como espaços territoriais para toda a desconcentração dos serviços públicos do Estado”, tendo lembrado, de forma quase cómica, digo agora eu, que este modelo é hoje uma ideia muito consensual em Portugal, “não apenas no PS, mas noutros partidos" assim como na "comunidade técnica e científica que há muito estuda o planeamento e o desenvolvimento regional".
A parte cómica, senão dramática, ou mesmo as duas coisas, do discurso que emana do “racionalismo político socrático”, reside, precisamente, na pretensão deste político em sustentar a sua argumentação na comunidade técnica e científica “que há muito estuda o planeamento e desenvolvimento regional”, mas que, como todos os transmontanos muito bem sabem, ainda não conseguiu planear nada e desenvolver coisa nenhuma, pelo menos nas regiões mais deprimidas do país; as mesmas a quem interessa uma verdadeira regionalização e que só sairiam beneficiadas, de facto, com um efectivo projecto de desenvolvimento regional e local.
Se há estudos técnicos e científicos que garantem que este modelo de cinco regiões é orgânico e susceptível de potenciar os serviços de estado a nível regional, então porque não se dão a conhecer à comunidade? Porque se encerram esses estudos numa redoma de gabinetes onde se movem esses “planeadores de desenvolvimento” que até ao momento ainda não conseguiram implementar desenvolvimento nenhum?
De facto, este “plano pré-regionalização” de Sócrates nada mais é do que uma reciclagem do projecto cavaquista que o actual Presidente da República, durante um dos seus mandatos enquanto Primeiro-Ministro, implementou. Cavaco Silva foi capaz de já no seu tempo dar execução a estas “cinco regiões plano” a partir das Cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional. E quais foram os resultados?
Agora José Sócrates vem propor esse mesmo modelo com vista a avaliar as virtudes da desconcentração administrativa, e só depois, afirma o governante, pensa conseguir as “condições políticas para um futuro referendo à regionalização".
Mas de que referendo está a falar o senhor Primeiro – Ministro? De um referendo para a validação da criação de uma regionalização assente em apenas cinco regiões, ou de um referendo para uma regionalização que contemple também, por exemplo, a região administrativa de Trás-os-Montes e Alto Douro?
Na verdade, o que o “anti-regionalista” e actual Primeiro-Ministro de Portugal parece estar a preparar, nada mais é do que uma regionalização “a seu jeito”. Ou seja, infere-se ou poder-se-á inferir – o futuro o confirmará -, que o que o senhor secretário geral do PS pretende criar, nada mais é do que um modelo de regionalização assente em cinco áreas territoriais plano, similar ao projecto que durante a campanha e o debate que surgiu com o último referendo muitos socialistas, sociais-democratas, e mesmo “bloquistas”, defenderam.
Esse projecto de “regionalização” parece efectivamente ser o modelo que mais interessa a alguns políticos centralistas que têm convivido muito bem com a disparatada macrocefalia que transborda das duas principais cidades do litoral.
Uma regionalização que parta da experiência de uma desconcentração administrativa baseada em cinco regiões plano e onde Lisboa, Porto, Coimbra, Évora e Faro surjam como as capitais dos novos território administrativos, não interessa à região de Trás-os-Montes e Alto Douro, porque a experiência de planificação e desenvolvimento regional protagonizada pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Norte, desde a década de 90 do Séc. XX, não o aconselha.
Uma grande Região Norte com uma concentração de serviços no Porto, apenas servirá para manter o processo acelerado de esvaziamento local, promulgando-se, desse modo, a incapacidade de inverter a tendência depressiva e de desertificação que a região transmontana atravessa.
O futuro dos transmontanos terá que sair das mãos dos transmontanos; da sua capacidade de gerar riqueza, da sua capacidade de gerir essa riqueza, da sua capacidade de saber planear o seu desenvolvimento e de transformar e reconstruir a sua terra. Ora, isso só será possível com a instituição democrática da Região Administrativa de Trás-os-Montes e Alto Douro.
O Projecto do Governo PS que agora pretende reorganizar em moldes descentralizadores o aparelho administrativo do Estado em cinco “Regiões-Plano”, poderá, no futuro, corresponder a um efectivo concretizar das regiões administrativas, como no passado fim-de-semana garantiu José Sócrates. Contudo, existe um risco para Trás-os-Montes que é indispensável equacionar. E esse risco reside no facto de um próximo referendo à regionalização apenas poder vir a dar exequibilidade política a cinco regiões administrativas em concreto, as mesmas que hoje se chamam “Regiões–Plano” e que actualmente o PS propõe como “modelo coerente para a administração desconcentrada do estado”.
Se tal vier a acontecer, e se a região transmontana ficar inclusa numa grande região Norte, assinar-se-á o decreto que dará óbito definitivo a esta terra, que por variadas vezes já demonstrou não querer… e não saber morrer.Luis Pereira [27-03-2006]Nota: este texto foi escrito como um mote para o debate do processo de regionalização que o actual governo colocou em curso e que em muito se deverá repercutir no futuro da região transmontana. Todas as contribuições, opiniões e ideias são bem-vindas a este debate. O NN publicará todos os textos dos nossos leitores que nos chegarem sobre este assunto. Para já reabre-se a secção de comentários para que todos aqueles que pretenderem, possam dar as suas achegas.
Sócrates defendeu esta nova estruturação territorial do estado e disse não compreender a surpresa manifestada por muitos, uma vez que, refere Sócrates, “essa orientação está escrita num livrinho: chama-se Programa do Governo do PS. Lá está escrito que devemos aproveitar as cinco regiões-plano como espaços territoriais para toda a desconcentração dos serviços públicos do Estado”, tendo lembrado, de forma quase cómica, digo agora eu, que este modelo é hoje uma ideia muito consensual em Portugal, “não apenas no PS, mas noutros partidos" assim como na "comunidade técnica e científica que há muito estuda o planeamento e o desenvolvimento regional".
A parte cómica, senão dramática, ou mesmo as duas coisas, do discurso que emana do “racionalismo político socrático”, reside, precisamente, na pretensão deste político em sustentar a sua argumentação na comunidade técnica e científica “que há muito estuda o planeamento e desenvolvimento regional”, mas que, como todos os transmontanos muito bem sabem, ainda não conseguiu planear nada e desenvolver coisa nenhuma, pelo menos nas regiões mais deprimidas do país; as mesmas a quem interessa uma verdadeira regionalização e que só sairiam beneficiadas, de facto, com um efectivo projecto de desenvolvimento regional e local.
Se há estudos técnicos e científicos que garantem que este modelo de cinco regiões é orgânico e susceptível de potenciar os serviços de estado a nível regional, então porque não se dão a conhecer à comunidade? Porque se encerram esses estudos numa redoma de gabinetes onde se movem esses “planeadores de desenvolvimento” que até ao momento ainda não conseguiram implementar desenvolvimento nenhum?
De facto, este “plano pré-regionalização” de Sócrates nada mais é do que uma reciclagem do projecto cavaquista que o actual Presidente da República, durante um dos seus mandatos enquanto Primeiro-Ministro, implementou. Cavaco Silva foi capaz de já no seu tempo dar execução a estas “cinco regiões plano” a partir das Cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional. E quais foram os resultados?
Agora José Sócrates vem propor esse mesmo modelo com vista a avaliar as virtudes da desconcentração administrativa, e só depois, afirma o governante, pensa conseguir as “condições políticas para um futuro referendo à regionalização".
Mas de que referendo está a falar o senhor Primeiro – Ministro? De um referendo para a validação da criação de uma regionalização assente em apenas cinco regiões, ou de um referendo para uma regionalização que contemple também, por exemplo, a região administrativa de Trás-os-Montes e Alto Douro?
Na verdade, o que o “anti-regionalista” e actual Primeiro-Ministro de Portugal parece estar a preparar, nada mais é do que uma regionalização “a seu jeito”. Ou seja, infere-se ou poder-se-á inferir – o futuro o confirmará -, que o que o senhor secretário geral do PS pretende criar, nada mais é do que um modelo de regionalização assente em cinco áreas territoriais plano, similar ao projecto que durante a campanha e o debate que surgiu com o último referendo muitos socialistas, sociais-democratas, e mesmo “bloquistas”, defenderam.
Esse projecto de “regionalização” parece efectivamente ser o modelo que mais interessa a alguns políticos centralistas que têm convivido muito bem com a disparatada macrocefalia que transborda das duas principais cidades do litoral.
Uma regionalização que parta da experiência de uma desconcentração administrativa baseada em cinco regiões plano e onde Lisboa, Porto, Coimbra, Évora e Faro surjam como as capitais dos novos território administrativos, não interessa à região de Trás-os-Montes e Alto Douro, porque a experiência de planificação e desenvolvimento regional protagonizada pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Norte, desde a década de 90 do Séc. XX, não o aconselha.
Uma grande Região Norte com uma concentração de serviços no Porto, apenas servirá para manter o processo acelerado de esvaziamento local, promulgando-se, desse modo, a incapacidade de inverter a tendência depressiva e de desertificação que a região transmontana atravessa.
O futuro dos transmontanos terá que sair das mãos dos transmontanos; da sua capacidade de gerar riqueza, da sua capacidade de gerir essa riqueza, da sua capacidade de saber planear o seu desenvolvimento e de transformar e reconstruir a sua terra. Ora, isso só será possível com a instituição democrática da Região Administrativa de Trás-os-Montes e Alto Douro.
O Projecto do Governo PS que agora pretende reorganizar em moldes descentralizadores o aparelho administrativo do Estado em cinco “Regiões-Plano”, poderá, no futuro, corresponder a um efectivo concretizar das regiões administrativas, como no passado fim-de-semana garantiu José Sócrates. Contudo, existe um risco para Trás-os-Montes que é indispensável equacionar. E esse risco reside no facto de um próximo referendo à regionalização apenas poder vir a dar exequibilidade política a cinco regiões administrativas em concreto, as mesmas que hoje se chamam “Regiões–Plano” e que actualmente o PS propõe como “modelo coerente para a administração desconcentrada do estado”.
Se tal vier a acontecer, e se a região transmontana ficar inclusa numa grande região Norte, assinar-se-á o decreto que dará óbito definitivo a esta terra, que por variadas vezes já demonstrou não querer… e não saber morrer.














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